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segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Bugatti Veyron: eu não gosto.

O seu lançamento chamou a atenção da mídia de todo o mundo. Quem o conheceu se encantou com a brutalidade de seus 1001 cavalos. E a etiqueta abismal de 1 milhão de Euros garantiu seu passaporte ao topo do mundo da exclusividade.

Mas para mim, o Veyron é um dos maiores símbolos da vulgaridade a repousar sobre quatro rodas. Um carro de duas toneladas e dez radiadores, cujo único diferencial é a capacidade de atingir 400 quilômetros por hora em condições controladas – e por alguns segundos, antes dos pneus de 38000 dólares se desintegrarem ou atingirem 4000 quilômetros. Um automóvel de estilo excessivo e emergente, feito mais para Paris Hiltons e rappers multimilionários que para pilotos, gentlemen drivers ou apaixonados por automóveis em geral.

Será que estou enganado?


Dez radiadores. Às vezes sinto vergonha de ser jornalista automotivo. Quantos deles vocês viram apontando o absurdo que é um automóvel possuir dez malditos radiadores, sendo seis apenas para o motor – que ainda precisa ficar exposto ao ar livre? Caindo na armadilha de press releases destinados a transformar cada defeito inevitavelmente aparente em uma qualidade diferenciada, quase todos os testes mencionam o mundo de radiadores como um truque divino para arrefecer a fúria dos 1001 cavalos. O Veyron é tratado como um extra-terrestre, um bicho de sete cabeças, o Williams FW14B do mundo dos automóveis. Poucos perceberam o óbvio: o W16 tem sérios problemas de superaquecimento, e este foi um dos principais motivos a atrasar o seu lançamento – previsto inicialmente para 2003. Os seis radiadores não representam uma solução de engenharia: é um remendo um tanto quanto embaraçoso para um carro de 1 milhão de euros.
Há dezenas de preparadoras de ponta na Europa, EUA e Japão extraindo 1000 cavalos (ou mais) duráveis em motores como o LS7 do Corvette, o V10 do Dodge Viper ou o 2JZ do Supra, com dois turbos roletados de geometria variável, intercoolers, apenas um radiador de água com maior capacidade e outro de óleo. Os melhores, feitos por empresas como a Nelson Racing Engines e a Hennessey, não apresentam problemas de superaquecimento. E não pense que o trunfo do Veyron está na durabilidade: se você estuprar o motor do Bugatti por muito tempo, ele vai danificar anéis, bronzinas, moer mancais, enfim; vai estourar exatamente como qualquer outro motor no mundo. Você acha mesmo que o propulsor W16 é algo de outro planeta, em um nível de construção ou durabilidade acima de um motor de Lamborghini, Ferrari ou Porsche? Acha que é só o Veyron que consegue ter uma marcha lenta estável e 1000 cavalos? Ei, não seja ingênuo.
Como pode ser visto, uma das maiores qualidades do W16 é o seu pacote compacto

A única coisa que ele tem de diferente é o exotismo. E este é o seu maior defeito. O Bugatti não possui dezesseis cilindros porque é melhor. Não possui dezesseis cilindros porque é a única maneira de se chegar a 1000 cavalos com segurança. Nada disso é verdade. Ele só possui o W16 para ser exótico. Puro marketing. E graças a isso, temos um motor que é uma autêntica criptonita, com 80 quilos a mais que um "elefante laranja" V8 Hemi 426 de 1970 e seus 328kg de ferro fundido. Não serve pra nada – e por isso, esta configuração não é usada em nenhum outro carro do mundo, de rua ou de pista. Pure luxurious garbage.

E nisso, chegamos ao ponto que definitivamente sepulta minhas intenções de adquirir um (ahem, claro) – o peso. O Veyron é uma bigorna feita de diamantes: luxuosa, excessiva, brilhante, mas ainda uma bigorna. Os engenheiros tiveram de fritar o cérebro por centenas de noites em claro para conseguir transformar um carro de duas toneladas em algo bom de curvas e que não fritasse os freios em uso intenso. Isso me lembra o sofrimento dos engenheiros que trabalham para o Oscar Niemeyer.
O interior é bonito e luxuoso. Mas um Porsche Panamera possui requinte similar – por uma fração do preço.

Ainda assim, em Nurburgring Nordschleife, ele fica: 18 segundos atrás do Viper ACR, 15 atrás da Ferrari Enzo, a 14s do Corvette ZR1 e Nissan GT-R, a 9s do Porsche 997 GT2 e a 7 segundos do Pagani Zonda F. O seu tempo de volta é semelhante ao Lamborghini Murciélago LP640 (640 cv, 1805 kg), McLaren Mercedes SLR (626 cv, 1768 kg), Porsche 997 GT3 (435 cv, 1376 kg) e o Mercedes SLS AMG (571 cv, 1620 kg). Portanto, suas qualidades como carro de performance são inquestionáveis, mas o cronômetro mostra que ele está longe de ser absoluto em qualquer coisa senão a teoria.

Isso deixa claro algumas coisas: o maior prejuízo do Veyron está mesmo nos 400 quilos do W16 – mais os seus seis radiadores. O V12 da já antiga Ferrari F50, por exemplo, pesa 198kg. E 1000 cavalos não servem para muito em um autódromo que não seja Monza ou a pista de testes do Top Gear. Esta potência quase nunca vê o solo – o que explica como o Lamborghini LP640, com 360cv e 200kg a menos, consegue obter mesmo tempo de volta em Nordschleife. É por isso – e não por falta de ousadia – que as outras marcas não oferecem tanta potência. Se alguém duvída do que eu estou falando, clica aqui.

Até cerca de 250 quilômetros por hora, o Veyron toma um completo espanco do McLaren F1 – em linha reta! Mesmo com tração integral e 400 cavalos a mais, o Bugatti não consegue acompanhá-lo. Este é o mundo real. O que sobraria ao Veyron, então? Classe e distinção, sangue azul, estirpe, berço? Não. A cada versão limitada feita pela marca, a cada série especial feita por empresas como a Mansory, a cada dono que decide folheá-lo a ouro, fica mais clara a falta de sofisticação e o excesso de vulgaridade que este carro inspira e atrai. Quando o desenhou, o eslovaco Jozef Kaban possuía no currículo pouco mais de alguns compactos, como o VW Lupo e o Seat Arosa. O resultado não poderia ter sido diferente.
É um automóvel paradoxal, feito para emergentes leigos com sede de ostentação, a despeito de toda a sua complexidade mecânica e seu poder de fogo.
É por isso que eu não gosto do Bugatti Veyron. Dê-me as chaves de um Lamborghini Murciélago LP640, por favor.

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