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segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Carros chineses, o motorista brasileiro e a falta de habilidade no volante

Já vi ao vivo nas ruas carros com dizeres estampados na porta tornando pública a insatisfação do proprietário com o carro da mesma forma como vi em uma foto de um JAC J3 em um e-mail que recebi. Já vi Ford Ka, GM Blazer, sem falar em casos com VW. Isso se torna mais chamativo no chinês por que muita gente está com essa dúvida na cabeça: “será que vale a pena apostar em um JAC, o preço é tão bom pelo conteúdo oferecido?”

É impressionante, por exemplo, ainda encontrarmos pessoas que acham que “VW nunca quebra”, “Carro de marca japonesa não dá defeito” ou “Fiat dá muito probleminha…”. Não é minha intenção defender essa ou aquela marca nesse texto. Quero apenas exemplificar que como máquina que é, qualquer automóvel está sujeito a quebras.

Problemas diversos em todas as marcas

A VW teve que trocar milhares de motores e refazer outros milhares de motores de Gol (tido como símbolo de resistência) devido a erro de especificação do lubrificante pelo fabricante, o que causou quebras prematuras em milhares de carros, gerando um enorme recall. Pior ainda foi o recall devido a problemas no freio que simplesmente deixavam de contar com a atuação do servofreio de repente. A Toyota passou pelo vexame mundial de carros que ficavam acelerados repentinamente, alguns pelo tapete, outros por defeito no acelerador eletrônico. A Fiat, por sua vez, há muito tempo não enfrenta as dificuldades em passar marchas como na época dos 147.

Há 30 anos atrás, carro japonês ainda era uma dúvida e hoje virou sinônimo de robustez. Na década de 90, os coreanos da Hyundai eram os maiores exemplos de mico sobre rodas e hoje viraram até sinônimo de status. Os carros de fabricantes chineses estão começando agora a permear todo o mundo e sofrem do mesmo preconceito que atingiu japoneses e coreanos em suas épocas. Eu não duvido que daqui a alguns anos a história se repita com os chineses e passem a ter o mesmo nível de qualidade que qualquer outro carro de outra nacionalidade.

Sabe qual o verdadeiro segredo de Toyota e Honda? Pós-Venda. Suas concessionárias possuem um bom atendimento, mas não se limitam somente ao cafezinho e cortesia. Pelo contrário: o principal, que é prestar um serviço de qualidade no bem do cliente, é feito com competência e o proprietário acaba esquecendo daquele “probleminha no vidro”, da “luzinha que piscava no painel” ou do “barulhinho na suspensão”, porque na primeira oportunidade resolveram o defeito a contento, sem necessidade de retornos ou aguardar peças.

Já para quem não acha que somente a concessionária sabe mexer no carro dela simplesmente por que possui o mesmo logotipo na fachada, isso não representa muito, pois deixa o carro em um mecânico de confiança ou faz ele mesmo pequenos reparos que provavelmente não voltarão a acontecer. Basta ter peças de qualidade à disposição.

O principal mérito dos “carros chineses”, em minha opinião, não é o custo-benefício aparente (aquele que só leva em conta o que os olhos vêem ou o que é lido no folheto de vendas), mas o fato de terem apontado os holofotes para a margem de lucro exorbitante das montadoras instaladas em solo pátrio. O resultado são carros consagrados de montadoras tradicionais no Brasil estarem sendo vendidos a preços mais em conta com muito mais equipamentos e equiparando-se aos importados. Isso sem falar nas qualidades dinâmicas que uma parte das pessoas despreza nos veículos, achando que só pilotos de corrida precisam de freios de boa modulação ou direções precisas que “contam” ao motorista o que se passa “lá fora”.

Os asiáticos em geral tem a capacidade de aprender muito grande e rapidamente podem estudar os grandes “best sellers” para fazer algo igual ou superior. Uma característica semelhante é encontrada na indústria automobilística alemã: eles não deixam a história de lado. Todo o desenvolvimento de cada novo modelo ou geração de um automóvel sempre leva em conta as lições aprendidas com o antecessor. Isso leva a uma melhoria contínua que resulta nos carros mais cobiçados em qualquer parte do mundo.

Será que somos mesmo apaixonados por carro?

Toda essa discussão é fomentada pelo fato do brasileiro pensar que é apaixonado por carro. Isso não é verdade! Isso foi um slogan infeliz da Distribuidora Ipiranga que, dado o poder da televisão sobre a cabeça das pessoas, virou senso comum.

Para mim, quem gosta de carro não valoriza mais o “valor de revenda” do que o “valor de uso”, característica típica do motorista brasileiro. No Brasil, boa parte das pessoas prefere deixar de comprar o carro que mais gostaram de verdade porque após três ou quatro anos seu valor estará alguns trocados mais baixo do que o concorrente que, apesar do bom valor de revenda, não é capaz de propiciar o mesmo prazer ao dirigir ou satisfação nas viagens feitas.

Falta de conhecimento e habilidade

Outro exemplo de que o típico motorista brasileiro vê o carro somente como um meio de transporte é sua total falta de conhecimento básico sobre a máquina que dirige. E como dirige mal… Esse parágrafo poderia ser o maior de todos, dado os inúmeros exemplos que poderiam ser citados de incontáveis motoristas que parecem ser avessos à fluidez no trânsito. Dirigir rapidamente não significa voar nas ruas e estradas, mas sim não ser um obstáculo móvel aos outros que se utilizam das vias públicas. Mas a culpa é sempre do carro “mil”, essa invenção brasileira que prova mais uma vez a aversão ao prazer ao dirigir: “não dá para acompanhar, meu carro é 1,0″ ou “meu carro é ‘mil’ e por isso não consigo ir mais rápido”. Será que esses “motoristas mil” acham que ao cruzar a barreira dos 4.000 RPM, o motor irá explodir? Um exemplo bem próximo de mim é o meu pai. Dividimos um Fiesta Sedan 1.0. Quantas vezes no meio da ladeira, ele subiu a marcha para segunda ou terceira porque o carro chegou a 4.000 RPM?

Ah, as auto-escolas… Outro dia vi um aluno dirigindo com o instrutor ao lado eram 19:00 horas (sim, agora a legislação prevê aulas à noite…) e o carro apenas com as luzes de posição (vulgo “lanterna”). E assim sairá mais um motorista às ruas com a consciência de que basta dirigir devagar para mostrar que é cauteloso e possui “educação no trânsito”. Há pouco tempo atrás o acidente que ceifou a vida de uma advogada no bairro paulistano do Itaim teve uma exposição enorme por parte da imprensa que de forma leviana concentraram toda a culpa no motorista que sobreviveu. A motorista que avançou o semáforo com luz vermelha, coitadinha, morreu e por isso teve seu pecado perdoado, a ponto do promotor do caso afirmar que ela “não teve a mínima culpa no episódio”. É óbvio que a velocidade incompatível agravou bastante a colisão, mas não foi a causadora. Foi o agravante.

Se me permitem me estender um pouco mais nesse parênteses que pouco tem a ver com carro chinês, mas muito com o motorista brasileiro, vou utilizar a matemática como forma imparcial de justificar minha opinião acima: na física existe uma grandeza chamada Quantidade de Movimento, que é produto da massa de um corpo pela velocidade do mesmo. Isso representa o poder que um corpo tem de deslocar outro no impacto com ele.

Q = m * v ; onde Q= quantidade de movimento, m = massa do veículo, v = velocidade do veículo.

Se o Porsche realmente vinha a 150 km/h (mesmo eu acreditando que estivesse bem mais rápido) com seus 1600 kg, isso significa que um caminhão pequeno (algo como um MB 710) vindo na velocidade permitida da via (60 km/h) arremessaria o SUV da advogada da mesma forma que o rápido esportivo.

Como a gravidade da colisão deve levar em conta a energia dissipada e não necessariamente o “arremessamento” do veículo, chegamos à energia cinética que é o produto da massa pelo quadrado da velocidade:

Ec = m * v²; onde Ec = energia cinética, m = massa, v = velocidade do veículo.

Assim sendo, o acidente teria a mesma gravidade se a advogada tivesse furado o sinal de trânsito na frente de um caminhão médio como um MB 1620 com metade de sua carga útil andando na velocidade permitida na via.

Conclusão

A motorista provavelmente sofreria as mesmas lesões (isso sem contar a maior altura de um caminhão) sem que o motorista do outro veículo fosse taxado como “assassino”.

Por essas e outras é que as marcas chinesas não terão dificuldade em entrar no mercado brasileiro oferecendo algo que encha os olhos – e não esvazie os bolsos – sem necessitar passar anos desenvolvendo algo inovador. Diferente do europeu, que quer saber o resultado do crash test feito, dentre outros itens importantes, o brasileiro quer mais um enfeite de garagem, que seja bom de olhar e, se for bom de andar, melhor. Um binômio que os chineses oferecerão em pouquíssimo tempo.

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